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A data de 5 de Outubro, da Proclamação da República Portuguesa, incomoda muitos monárquicos, especialmente os Miguelistas. Estes animam actualmente a propaganda contra a República. E para sobrepor e tentar ocultar a data da proclamação da República revivem uma suposta data para a independência de Portugal.
O Pacto, ou paz de Zamora é um acto que afirma a vassalagem do Rei Afonso Henriques ao Imperador Afonso VII de Leão. Este reconhece Afonso como um entre outros reis seus súbditos, similar aos Reis de Navarra ou Aragão. E concedeu a Afonso a tenência do senhorio de Astorga, o que fez de Afonso um seu vassalo. Por esse senhorio Afonso devia acorrer às necessidades de Afonso VII caso este o chamasse. Basta esta prova dos factos para ver quão forçada e fraudulenta é a tentativa destes autores falsearem a História por razões de gosto ideológico e falta de honestidade científica. Nota: a independência de Portugal é posterior, mas isso é outro assunto que nada tem a ver com o 5 de Outubro data da Implantação da República Portuguesa.
Seria melhor à causa monárquica afirmar outras datas para a independência de Portugal. E digo outras datas , porque a independência de Portugal é um processo, e não algo ao estilo do “estado novo” que se resolvia com uma data e um herói.
Afonso Henriques tal como a sua mãe, nunca se remeteu à condição de Conde e vassalo do seu primo o Imperador Afonso VII. Aliás, Afonso Henriques sempre se intitulou Príncipe e neto do Imperador Afonso VI. As suas pretensões são a da independência. E coincidem com as dos Senhores no norte do Condado Portucalense e com as da Igreja de Braga principalmente.
Começa logo por não comparecer em 1135 à coroação do seu primo Afonso VII como Imperador de Leão a que pertencem os Reinos de Aragão, de Navarra e o Condado Portucalense naturalmente. A seguir faz incursões na Galiza e derrotado é obrigado em 1137 a assinar à Paz de Tui. São testemunhas o Arcebispo de Braga D. Paio Mendes, o Bispo do Porto D. João Peculiar, e os Bispo de Segóvia, Tui e Ourense.
Em 1139 ou 1140, os Historiadores divergem na data em que passa a assinar como Rex. Isto depois da tradição dizer que foi na Batalha de Ourique que foi aclamado de Rei pelos soldados. E aqui não há nada de certezas. Não há certeza do local onde decorreu a batalha. Segundo palavras de Freitas do Amaral (2000), a primeira vitória de Afonso Henriques terá sido entre algumas centenas de combatentes de cada lado, e não terá sido muito demorada já que três dias depois estaria de volta a Coimbra. São as crónicas posteriores que fantasiam este episódio.
Em 1141 o torneio ou justas de Valdevez ditam uma trégua até à paz de Zamora em 1143. E aqui os monárquicos portugueses escolhem, infelizmente, um acto de vassalagem para comemorar a independência de Portugal. Do encontro não há nenhum documento que altere a vassalagem de Afonso Henriques desde as tréguas de Tui. Em apenas duas cartas se refere um “colóquio” do Imperador com o Rei de Portugal e com a presença do Cardeal Guido enviado de Roma. O reconhecimento de Afonso Henriques como Rei faz-se no contexto de vassalagem ao Imperador tal como acontece com o Rei de Navarra ou de Aragão. Reforça ainda a vassalagem o facto de Afonso VII ter concedido a tenência de Astorga-Zamora ao Rei Afonso Henriques. Este acto de vassalagem obrigaria o Rei Português a acorrer em auxílio de Afonso VII a pedido deste. Para Afonso VII este pacto de Zamora aumenta-lhe o prestígio. Sempre é mais um Rei que tem como seu vassalo. E tanto assim é que Afonso Henriques logo em Dezembro desse mesmo ano, e em violação do acordado, escreve ao Papa a pedir a “liberdade romana” que o colocaria sob autoridade do Papa e dessa forma isento de outros poderes civis. No caso concreto liberto da “dependência feudal do Imperador de Leão” (Freitas do Amaral: 2000). Se Afonso Henriques se sentisse independente, não precisava pedir nada a ninguém. Fraca data escolhem os monárquicos para tentar afirmar a independência de Portugal e dessa forma tapar a proclamação da República portuguesa. Pois é isso que tentam os que restam do Miguelismo português.
Mas pior para Afonso Henriques, já que na carta de resposta do Papa, este não o trata por Rei, mas apenas por Duque. E também não chama a Portugal reino, mas apenas “terra”. A humilhação feita pelo Papa Lúcio II a Afonso Henriques não podia ser maior. Lembro-me que estas coisas não se aprendiam na cartilha única da quarta classe do tempo do salazar. Os miguelistas portugueses andam pelo mesmo trilho. Se estes quisessem uma data significativa escolheriam talvez o ano de 1156 em Afonso VII divide propriedades no Rio Minho afirmando acordo de Afonso Rei de Portugal. E aqui sim. O Afonso VII decide de um acto com o consentimento de Afonso Henriques, colocando-se assim em pé de igualdade na tomada de decisão. Afonso Henriques é de facto Rei de Portugal. Passa a ser de “jure” quando recebe do Papa a “bula Manifestis probatum”. Era o ano de 1179 e tinha o Rei Português 35 anos de idade.
Bibliografia:
Amaral, Diogo Freitas (2000) – D. Afonso Henriques. Biografia. Bertrand Editora.
Mattoso, José (2006) – D. Afonso Henriques. Mem Martins: Circulo de Leitores.
Mattoso, José (2015) – Identificação de um País. Lisboa: Temas e Debates.
António Borges Regedor
5 de Outubro de 1910
Proclamação da República Portuguesa
Os indivíduos deixam de ser súbditos para serem cidadãos. Deixam de ser vassalos para serem livres. Esta é a questão filosófica essencial à diferença entre Monarquia ou República. De resto há muitas diferenças entre as Monarquias, como o mesmo acontece em Repúblicas. Umas e outras podem ser mais democráticas ou mais totalitárias, revestindo-se de formas diversas. Gostaria de limitar ao essencial a diferença filosófica que é a da dignidade ontológica. Ser súbdito ou ser livre. Filosoficamente prefiro ser livre. E esta é a minha declaração de interesses.
Hoje comemora-se a República. Esta forma de ser livre, igual e fraterno.
António Borges Regedor
Tempos houve em que os portugueses eram diferentes. Uns nasciam soberanos, outros súbditos. Os súbditos nasciam para prestar vassalagem aos soberanos. Uns nasciam senhores, outros servos. E estes para servir os outros. Uns nasciam na aristocracia e outros no povo. Alguns trânsfugas do povo até conseguiam fugir para o clero, mas nunca chegavam à aristocracia. Alguns, burgueses, eram “bons homens” mas não eram nobres.
O que os tornou iguais foi a cidadania. O que os fez sentir parte integrante do todo social, foi a coisa pública, a rés-pública, a república. O que lhes deu iguais direitos e poderes foi a democracia. O que falta são políticas públicas, não privadas, políticas distributivas e não acumulativas. Contribuição do capital e não apenas do trabalho.
António Borges Regedor
O mensageiro do Rei é um romance de Francisco Moita Flores que coloca em paralelo a realização de um filme com um romance, e dentro deste duas histórias de amor. A do Rei com a artista francesa e a do mensageiro com a filha do burguês que queria ser conde. O cruzamento da história do regicídio com a da implantação da república e do desânimo com esta última no advento da ditadura.
Com a experiência de Moita Flores temos as histórias de amor, com as apreciações políticas e notas sociais em que a nossa simpatia se reparte por todos. Simpatia pelo mensageiro e o infortúnio do seu amor não autorizado. Pela sua amada que é encerrada num convento por ordem do pai. Pelo Rei que se vê com um reino para governar, sem que isso lhe interesse ou alguma vez o esperasse. Pela sua amada que aceita o afastamento por amor de quem terá de fazer um casamento de conveniência real. O Rei segue o seu caminho real, o mensageiro enriquece na américa, a artista e amante real tem reconhecimento e fama internacional. Só a namoradinha do mensageiro morre de tuberculose o que nos faz nutrir ainda mais simpatia por ela.
É leitura obrigatória que certamente não será obstáculo de outras actividades porque o livro lê-se com a avidez do conteúdo.
Flores, Francisco Moita - O mensageiro do rei. Alfragide: Casa das Letras, 2017
António Borges Regedor
É possível assinalar três razões principais que contribuíram para a ausência de concretização das intenções republicanas de criação de uma rede de bibliotecas no país: a questão cultural de que a maior expressão é o analfabetismo, a questão ideológica e o modelo económico definido para a criação de bibliotecas.
De facto, como afirmamos, a primeira razão poderá encontrar-se no enorme índice de analfabetismo e na prioridade que o regime pretendeu conceder à questão da instrução pública. O regime republicano tem uma enorme preocupação com a instrução do povo nos ideais da cidadania republicana, e a leitura é elemento essencial para atingir esse objectivo.
Entende-se que só um povo a saber ler poderá corresponder ao ideal de cidadão consciente, informado e interveniente na vida pública. Por isso se diz que “Enquanto regime instaurado à luz duma ética de cidadania e democracia política, onde a instrução era um instrumento central, a I República irá necessariamente atribuir relevância à questão da leitura pública” (Melo, 2010, p. 13).
A segunda razão que entendemos poder estar na ineficácia da política de leitura pública é a questão ideológica. A primazia dada à política educativa tem a ver com a forte luta pelo controlo ideológico das camadas populares que leva os republicanos a colocar em marcha a enorme tarefa de promover o ensino laico e de cariz anticlerical, mormente na segunda metade do século XIX. Neste contexto, podemos, de algum modo, afirmar que a política de bibliotecas
populares é mais ideológica que educacional. As elites políticas republicanas mantêm a política bibliotecária herdada do liberalismo de oitocentos e, ‘latu sensu’, a legislação de 1870. Assim, a legislação que cria a Inspecção Geral das Bibliotecas e Arquivos Públicos (1887), posteriormente refundada pelo Decreto de 24 de Dezembro de 1901 com a designação de Inspecção das Bibliotecas Eruditas e Arquivos, mantém-se na República e coexiste com a Inspecção das Bibliotecas Públicas e Móveis, criada em 18 de Março de 1911. Quanto ao
organismo que tutela e supervisiona a inspecção das bibliotecas eruditas, é mantido pela política republicana em moldes idênticos aos do período anterior.
A ideia republicana sobre política bibliotecária assentava no desígnio de conceber, a par das bibliotecas tradicionais destinadas às elites ilustradas, bibliotecas para o povo, numa clara desvalorização social dos equipamentos destinados às camadas mais baixas da população e menos alfabetizadas, contribuindo desse modo para a manutenção de uma visão elitista da
função da biblioteca. Ora, tal quadro ideológico não concorrerá positivamente para a promoção das mesmas, nem para a promoção social dos leitores e potenciais beneficiários.
O que resulta destas ideias e correntes intelectuais que têm por objectivo a criação em Portugal de um sistema de bibliotecas semelhante ao das ‘free libraries’ anglo-saxónico, é o afastarem-se desse modelo na constituição das colecções bibliográficas e, consequentemente, na divisão dos públicos. As elites políticas liberais portuguesas concebem uma estrutura dicotómica de bibliotecas: por um lado, as bibliotecas eruditas destinadas às elites, as que
acolhem as livrarias confiscadas aos extintos conventos e as existentes nas escolas de ensino superior; e, por outro lado, as bibliotecas populares destinadas às camadas inferiores da população que retêm colecções ideologicamente orientadas.
Finalmente, a terceira razão é de natureza económica. No espaço anglo-saxónico o financiamento das bibliotecas públicas era feito através do lançamento de impostos locais e da participação e interesse de mecenas.
A prática de mecenato é frequente na criação de bibliotecas que recebiam igualmente o suporte financeiro público, de que é exemplo o industrial escocês, emigrado nos EUA, Andrew Carnegie (1835-1919), que “financiou a construção de 2509 bibliotecas no mundo anglosaxónico, segundo o princípio da sua posterior manutenção pelas comunidades locais” (Melo, 2010, p. 8).
O modelo de financiamento público no espaço anglo-saxónico surgiu em 1850 com o Public Libraries Act. O governo em Inglaterra autoriza o lançamento de impostos locais destinados às bibliotecas. Em Portugal, o modelo é completamente diferente. Não se verifica a existência de mecenas, como na Inglaterra e nos Estados Unidos, nem a legislação orienta, de algum modo,
o modelo de financiamento das bibliotecas. O Decreto de 18 de Março de 1911, no seu artigo 11.º, “obriga”, este é o termo utilizado, a fundar bibliotecas populares. No caso de os municípios já possuírem bibliotecas, terão que instituir secções populares. Este é um bom exemplo da separação conceptual e tipológica, patente no decreto de 1911, que mantém as bibliotecas eruditas e as bibliotecas populares, a que junta a tipologia das bibliotecas móveis.
Porém, as dificuldades dos municípios em obter a receita necessária para a criação e manutenção das bibliotecas populares e das bibliotecas móveis eram impeditivas da consumação do projecto republicano.
Em resumo, a relação entre o poder central e o poder local na concretização dos objectivos de criação de um sistema nacional de bibliotecas destinadas às camadas populares revela-se ineficaz. Falha em termos do conceito de biblioteca, porque não corresponde à ideia original
anglo-saxónica, é igualmente nulo pela ausência de meios de concretização do projecto, imputando aos municípios os custos de criação e manutenção das unidades.
António Borges Regedor
A emergência de uma nova mentalidade e cultura políticas, o surto de novos movimentos sociais e novas necessidades de mobilização e de educação popular, a supressão da insuficiência cultural, educativa das massas, a promoção da secularização no ensino, surgem como condição do exercício consciente da liberdade e da cidadania.
Para os republicanos, a reforma do sistema bibliotecário é uma questão fundamental à instrução do povo, considerando a necessidade desse sistema como um poderoso meio de modelação da cultura e mentalidade, a par da escola. O movimento republicano tinha forte inspiração externa, que se reflecte na crença de que era fundamental colocar a população portuguesa em situação similar àquilo que classificavam de “inteligência mundial”.
No primeiro diploma legislativo em matéria de política bibliotecária, promulgado em 1911, surge um moderno conceito de biblioteca, considerada como um espaço que não deve apenas “conservar os livros, mas torná-los úteis”, como instituição de ensino público consagrada “ao progresso da inteligência, à extensão da cultura científica, [constituindo] focos de irradiação mental” (Decreto de 18 de Março de 1911, Preâmbulo, p. 497).
As referências internacionais para os republicanos são os exemplos vindos dos ingleses e americanos, bem como o respectivo modelo cultural de ‘self instruction’, a que juntam os objectivos de ensinar, informar e distrair, que os anglo-saxónicos atribuem às bibliotecas.
As bibliotecas populares existem apenas nos grandes centros, conforme salienta o diploma de 1911: “Não bastam, porém, à instrução do povo português as actuais Bibliotecas dos grandes centros” (Decreto de 18 de Março de 1911, Preâmbulo, p. 498).
No novo contexto político, entenderam os republicanos reorganizar e reformular os serviços das bibliotecas e dos arquivos nacionais. Os legisladores republicanos são, entre os períodos examinados, os que vão mais longe na tipificação das bibliotecas, dividindo-as em três tipos: eruditas, populares e móveis, definindo as respectivas atribuições (artigo 2.º do diploma citado).
São, de igual modo, os que mais coerência concedem à criação do projecto dum sistema nacional de bibliotecas. A Direcção Geral da Instrução Secundária, Superior e Especial constituía a entidade de que dependiam os serviços das bibliotecas e arquivos nacionais. Para os legisladores de 1911, as bibliotecas eruditas são definidas como aquelas que, pelo carácter do seu depósito bibliográfico, se prestam ao desenvolvimento da cultura científica, literária e artística, ou se apresentam como magníficos repositórios de obras e documentos históricos. A missão destas bibliotecas seria a conservação e valorização do livro, como elemento de cultura científica, e como contributo e documento histórico, pelo seu valor patrimonial.
As bibliotecas populares, por seu turno, são destinadas “à vulgarização, expansão e propaganda do livro” (Decreto de 18 de Março de 1911, artigo 9.º). Com este decreto, pretende-se que sejam constituídas secções populares nas bibliotecas dependentes da Direcção Geral da Instrução Secundária, Superior e Especial. Na Biblioteca Nacional de Lisboa instruiu-se uma secção popular com espaço próprio, dependente dos recursos do tesouro público. Por seu lado, todas as câmaras municipais seriam obrigadas a fundar bibliotecas populares.
Quanto às bibliotecas móveis, propostas pela política republicana, são definidas como “colecções de livros enviadas pelas Bibliotecas Populares às diversas localidades da sua área, e destinadas à leitura no domicílio” (Decreto de 18 de Março de 1911, artigo 19.º).
A dimensão das colecções era pequena, de apenas 100 volumes, sendo que 50 deveriam ser obras de ficção. As bibliotecas móveis eram assumidas como extensão das bibliotecas populares, pois eram enviadas por estas e tinham a intenção de promover a “expansão do livro” e fazer a “propaganda da leitura” (Decreto de 18 de Março de 1911, artigo 20.º).
Mais uma vez, o endosso da responsabilidade do financiamento das bibliotecas para os Municípios não resulta na sua efectivação. Nem se forma uma rede de bibliotecas populares, nem, consequentemente, as suas extensões móveis.
António Borges Regedor
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