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Portugal nunca se tornou famoso pelo elevado índice de cultura, de alfabetização ou leitura. Tirando o momento histórico excepcional de actividade científica ligada à construção naval, navegação, astronomia, cartografia no período dos descobrimentos, o resto da história é cinzenta. Está no entanto pontilhada de casos singulares de excepcionalidade. Alguns deles como será o caso de D. Dinis o primeiro monarca a possuir uma biblioteca privada. Pedro Julião Rebolo que foi o Papa João XXI, mais dado à ciência que ao Papado. Luíz Vaz de Camões tanto dado às armas e aos amores como à cultura humanista. O iluminista Marquês de Pombal, que passa a considerar a Universidade de Coimbra uma instituição ‘pública’ numa linha de secularização do ensino. Frei Manuel do Cenáculo Villas Boas (1724-1814) que criou a Real Biblioteca Pública de onde deriva todo o edifício do sistema bibliotecário português. Egas Moniz, médico, Prémio Nobel. Saramago também Nobel entre outros. Vários pontos de luz numa realidade de base inculta, iletrada, dominada pelo ambiente religioso retrógrado, conservador da contra-reforma e cujo argumento para uma guerra civil foi a disputa entre liberalismo a absolutismo.
Em alguns momentos há luzes que se acendem na escuridão.
António Borges Regedor
O Iluminismo, expressão científica da visão do mundo, corrigiu o modelo obscurantista. O Liberalismo, expressão da burguesia ascendente, alterou o modelo terra-tenente da aristocracia rentista. O Republicanismo, expressão da liberdade, igualdade e fraternidade mudou o estatuto de súbdito para o de cidadão. No pós segunda guerra as democracias, expressão do bem estar social, do estado previdência e intervenção do estado nos sectores estratégicos corrigiram o liberalismo. No final do século vinte o neoliberalismo destruiu a social democracia herdeira do período de paz. É agora perante uma pandemia que percebermos que é fundamental o sector estratégico da economia estar na mão do Estado (que somos nós todos), que é fundamental a saúde, o ensino, a defesa, segurança e comunicações e transportes serem do estado. Ou seja, serem de nós todos.
Porque claramente vemos a mentira dos liberais que queriam menos estado. Banqueiros, Industriais, Concessionárias de serviços públicos como auto-estradas por exemplo, com lucros privados por deterem serviços públicos, reclamam hoje pelo estado. Para esses vampiros liberais o estado é hoje o que fizeram dele: mínimo, pobre, sem poder de os ajudar. É caso para dizer a frase de que os liberais tanto gostam: É o mercado seus estúpidos.
António Borges Regedor
Foto: Antigo convento de S. Francisco em Lisboa, para onde foi transferida a Real Biblioteca Pública da Corte em 1834, por necessidade de acomodar os fundos dos extintos conventos e mosteiros. À data da sua fundação, por Alvará de 29 de Fevereiro, integrou os fundos da Real Mesa Censória, que fora extinta em 1794 e esteve instalada na ala ocidental da Praça do Comércio.
Leitura Pública em Portugal. Das biblioteca privadas às bibliotecas públicas.
A crescente influência das correntes culturais do Iluminismo no nosso país e os progressos no comércio, indústria e, principalmente, do ensino que marcam o período do século XVIII tardio, contribuem para a paulatina mudança de mentalidades.
Datam igualmente do século XVIII importantes e decisivas iniciativas no âmbito científico e educativo, de entre as quais destacamos, nomeadamente: a fundação da Real Academia de História (1720), a fundação do Real Colégio dos Nobres(1761), a instituição da já referida Real Mesa Censória (1768), a formação da Imprensa Régia (1772), a reforma da universidade e a promulgação dos estatutos (1772), a lei relativa à organização do ensino primário (1772) e, finalmente, a fundação da Academia Real das Ciências (1779).
Até este período, as bibliotecas são, na generalidade, instituições da esfera privada. Imperiais, Régias, Religiosas, Pessoais.
É este contexto pedagógico-científico e político que vai possibilitar a decisão de transformar a Livraria Régia em Biblioteca Pública aberta aos estudos das Ciências e das Artes. No reinado de D. Maria I (1777-1816) é promulgado o alvará de 29 de Fevereiro de 1796, pelo qual é fundada a Real Biblioteca Pública da Corte que, em 1836, passará a Biblioteca Nacional de Lisboa.
Este é o episódio que marca a passagem da biblioteca da esfera privada à esfera pública.
António Regedor
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