. Curiosidades da conquista...
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Já fiz alguma navegação em embarcações à vela e construídas em madeira. E também algumas regatas. Em quase todas as situações há uma peça a afinar, uma outra que se danifica, um parafuso que salta. E em momentos de condições atmosféricas mais agrestes, já testemunhei um brandal a partir e mesmo mastros quebrados. Tudo isto em ambiente de camaradagem e com várias embarcações e barcos de apoio, é fácil de resolver. Lançam-se uns cabos de reboque e ninguém fica para trás. Todos chegam a bom porto para nos dias seguintes se dedicarem a reparar os danos.
Estas pequenas experiências fazem-me imaginar, tanto quanto possível, a impressionante logística necessária para a navegação no tempo da expensão marítima portuguesa.
O pensar que no barco teria de ir tudo o que fosse necessário para as reparações. Madeiras em tábua, em tronco para o caso de partir mastros. Ferramentas para isso. Martelos, laminas de serra cravos, estopa, tecidos, cabos e diversas ferramentas e peças.
O mesmo para a alimentação das tripulações. O biscoito como alimento fundamental. Mas também farinha e diversos grãos secos onde o feijão seria rei. A carne seria de porco, vaca, carneiro toda salgada, mas também alguns animais vivos. Imagino galinhas para ter ovos frescos e alguma vaca para dar leite além da carne em algum momento. Talvez enchidos e queijos que era o habitual dos viajantes e peregrinos. Também pescando se comeria peixe fresco de modo a poupar ao máximo as provisões de secos e salgados. Os frutos seriam secos. Possivelmente figos, uvas, amêndoas, nozes, avelãs. E claro que não faltaria vinho e água. Esta em barricas e a piorar a qualidade com o tempo. Mas que com algumas paragens para fazer as aguadas. Ou seja, o abastecimento de água, o bem mais precioso. A navegação exigiria toda o equipamento disponível à época, como as cartas de marear, compassos para traçar rotas, astrolábios, quadrantes. Haveria equipamento de primeiros socorros em uso na época. E claro, as habituais bugigangas para trocar com os indígenas. Espelhos, sinos, facas, pentes, anéis e vidros coloridos, peças de roupa. E com tanto valor a bordo e vidas a salvaguardar, não poderia faltar espadas, lanças, escudos, arcabuzes e balas, canhões e respectivas bolas de ferro. Capacetes e couraças. Tudo metido em embarcações que hoje nos fazem espantar de tão pequenas para tão grande aventuras e feitos.
António Borges Regedor
A leitura do artigo de João Abel da Fonseca intitulado “A empresa de Ceuta – Dos antecedentes às circunstâncias que ditaram as causas próximas” permitem-nos compreender melhor a lógica, o sentido e o alcance imediato da conquista de Ceuta. (1)
Ceuta foi conquistada em 1415 no reinado de D. João I. Afirma João Abel da Fonseca num texto intitulado “A Empresa de Ceuta – Dos antecedentes as circunstâncias que ditaram as causas próximas” que tal fora possível por actos que a possibilitaram e que já vinham de D. Dinis. Logo no início deste reinado, em 1280, foi criada uma armada para a defesa da costa Algarvia sediada especialmente em Tavira. Por sua vez, D. João I assina, em 1386, com a Inglaterra o Tratado de Windsor e a Convenção Marítima anexa. Desta forma Portugal garante “numa articulação entre o Mediterrâneo e o Atlântico, encontrou novos limites – o meridional no estreito de Gibraltar e, mais tarde, o setentrional no canal da Mancha” (Fonseca, 2016, p.63).
Borges Macedo é da mesma opinião e refere que “Portugal, com esta aliança, ao lado da independência como estado,conservou a sua função europeia de garantir uma área essencial de tráfego internacional,livre das hegemonias peninsulares”. (Cronica da Tomada de Ceuta. Jorge Borges de Macedo, na sua História Diplomática Portuguesa – constantes e linhas de forca, precisamente, no capitulo intitulado “A defesa do equilíbrio”) (Macedo 2006, cit in Fonseca, 2016). (2)
Não é só Portugal interessado no Mar e nos territórios de África.
Já em 1260 Afonso X de Espanha tinha ordenado uma expedição marítima punitiva a Sale (Marrocos).
Em 1291 pelo tratado de Monteagudo e pelo Acordo de Soria a costa Magrebina era dividida ficando Espanha com os territórios a oriente de Ceuta e Portugal com os territórios a ocidente desta cidade.
Mas não se tratava apenas de garantir uma zona alargada de navegação segura. Outros países também tomavam iniciativas marítimas concorrenciais.
Algeciras foi tomada por Fernando IV de Leão e Castela.
Por seu lado o Sultão Abu al‑Rabi Sulayman, Rei de Marrocos, contratou mercenários aragoneses que conquistaram Ceuta ao Sultão Muhammad III de Granada e a entregaram ao Rei de Marrocos em 1309.
Uma expedição às canárias em 1341 é desencadeada conjuntamente por lusos-florentinos-genoveses.
Em 1400 Henrique III de Castela enviou uma esquadra que destruiu Tetuão
A igreja católica também exercia pressão para a tomada de posições aos mouros. D. Dinis foi incentivado a conquistar terras que ainda não tivessem diocese. D. Afonso IV recebeu indulgências para a conquista do reino de Fez. E para a conquista de Ceuta foi pregada uma bula do Papa em Pisa, João XXIII, apesar de no período de tempo entre 1410 e 1415 será o período do grande cisma na igreja católica e haver três papas em simultâneo. O já referido e ainda em Roma Gregório XII e em Avinhão Bento XIII.
Em todo este contexto impunha-se a conquista de Ceuta. A ideia de ir sobre Ceuta nascera, pelo menos, em 1409. (Fonseca, 2016). Em 1411 é assinado um Tratado de Paz que se seguiria a tréguas em vigor até 1413. Seguiu-se a reunião do Conselho secreto ou Cortes de Torres Vedras em 1414. Depois é já o que sobejamente conhecemos. A construção de cerca de metade da armada construída nos estaleiros de Miragaia que à época era uma enorme praia e onde hoje é o edifício da alfândega transformado em museu das comunicações. O episódio do abastecimento que atira para este facto o costume do consumo de tripas. O embarque das tropas em Lisboa. As escalas em Lagos e Faro e finalmente a tomada de Ceuta com cerca de 237 navios sendo de entre eles cerca de 88 naus.
Ainda segundo o autor referido a empresa de Ceuta teria como objectivos a afirmação do poder régio, a reconciliação nacional, a saída para a precária situação económica de alguns nobres e o controlo do comércio.
(1) FONSECA, João Abel da. – A empresa de Ceuta – Dos antecedentes às circunstâncias que ditaram as causas próximas. In João Abel da Fonseca, José dos Santos Maia e Luís Couto Soares (Cor) - Ceuta e a Expansão Portuguesa:Actas XIV Simpósio de História Marítima. Lisboa: Academia de Marinha, 2016.
(2) MACEDO, Jorge Borges de – História diplomática portuguesa: constantes e linhas de força. Estudo de Geopolítica. [Lisboa]: Instituto da Defesa Nacional, 2006.
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