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(crónicas de Porto Vintage)
A Boavista era a designação abreviada para a Rotunda da Boavista e ruas que dela derivam. E cafés eram muitos, porque a população estudantil também era muita. Porque era hábito estudar nos cafés não só por razões de espaço nos domicílios, mas também por gregarismo juvenil. Muitos dos cafés da zona eram tomados por estudantes que sós ou em grupo, mais em grupo que sós, estudavam e conviviam. Nada de estranho no Porto onde o hábito de ir ao café era um ritual. E cafés também não faltavam. Na Rua Nossa Senhora de Fátima ao lado um do outro estavam o Rumo e o Romaria. Na Rua Júlio Dinis o Orfeu e o Orfeuzinho, de um lado, e do outro, o Lótus que entretanto fechou. Não longe daí, a duas centena de metros a Carvalhosa fornecia o Diu e o Guanabara. Estes já mais perto da faculdade de farmácia e de engenharia e também do Liceu D. Manuel II. Do Liceu Carolina Michaelis, só para raparigas, nem digo nada porque as raparigas nesse tempo não saíam à noite.
No centro da Rotunda, que se chama Praça de Mouzinho de Albuquerque, está o Monumento aos Heróis da Guerra Peninsular. O leão símbolo das forças Lusas, vence a águia que representa os invasores. Em tempos o comboio vinha até aqui. Uma estação terminal. Agora passa sob os pés o Metro e eleva-se a casa da música. Até o Bom sucesso, mercado de cheiro a peixe fresco, passou a gourmet. Tudo agora é círculo ou prisma. A recta já vem do Campo de Santo Ovídeo, hoje Praça da república, por uma linha estreita a que chamam rua da Boavista até onde alarga, por alturas do Hospital Militar Rei Dom Pedro V e que nos leva ao encontro do mar e ao sempre belo por-do-sol nas praias do Porto.
A Linha de Caminho de Ferro do Tâmega começava na estação de Livração-Marco de Canavezes na Linha do Douro. Seguia para Amarante, Celorico de Basto e ia até Arco de Baúlhe onde tinha a última estação. Isto já no concelho de Cabeceiras de Basto. Esta estação terminal de Arco de Baúlhe é hoje na sua totalidade um núcleo museológico dos caminhos de ferro portugueses. Foi inaugurada a 15 de Janeiro de 1949 e a linha foi encerrada a 1 de Janeiro de 1990. Foram quarenta e um anos de passageiros, mercadorias, correios, vida vivida de maquinistas, bagageiros, chefes de estação, água a correr para alimentar as caldeiras e carvão, muito carvão para dar vida a essa forma de ligar o território de Basto ao Rio Douro através de montes e vales, rasgando encostas e galgando rios.
A 8 de Janeiro de 2000, foi assinado um protocolo entre a Rede Ferroviária Nacional – REFER, E.P. e a Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto para a gestão e dinamização da Secção Museológica.
O conjunto inclui a Estação revestida com painéis azulejares, executados em 1940 por A. Lopes na Fábrica de Cerâmica Sant’Anna localizada em Lisboa. É um edifício de rés-do-chão e primeiro andar. A fachada ostenta no cimo e ao centro um belíssimo painel de azulejos com um escudo da nação e a inscrição: “Caminhos de Ferro do Estado”. A linha permanece no seu lugar de sempre. Para a travessia de uma plataforma a outra ainda lá estão as passadeiras constituídas por travessas de madeira. Pelo meio o balastro evidencia a passagem do tempo. As agulhas para os desvios de linhas e a plataforma giratória usada para inverter o sentido da marcha da locomotiva são outro motivo de memória. Ainda lá está a grua de abastecimento de água para as caldeiras das locomotivas e o torre depósito de água. O depósito de carvão consiste numa enorme caixa rectangular em paredes de granito. Na linha está uma composição constituída pelo furgão DEfv 506, uma carruagem fechada construída em 1908 pela «Dyle & Bacalan», em Lovaina na Bélgica. Destinava-se ao transporte de correio e despachos, que seguia acoplado a comboios de passageiros. O vagão EAKLMO 5937023 de caixa aberta para transporte de mercadorias foi construído entre 1909 e 1911 nas Oficinas do Barreiro. Há ainda o vagão-cisterna UHK 7012002 com a capacidade de 10 000 litros construído em 1926 pela empresa Van der Zypen & Charlier na Alemanha. A locomotiva MD 407 / N.º 8916, construída em 1908 na empresa «Henschel & Sohn» (Kassel, Alemanha), está numa cocheira onde também repousa a automotora a gasolina ME 5 construída em 1948, nas oficinas gerais da CP, em Santa Apolónia, Lisboa. Possui motor Chevrolet, a gasolina. O aspecto é o de uma habitual camioneta de passageiros em tudo idêntica às que víamos nas estradas. É ainda visitável a carruagem CEyf 453 construída em 1908 na empresa «La Métallurgique, Nivelles», na Bélgica. Destinava-se aos viajantes que seguiam em 3.ª classe. Uma carruagem de passageiros com entrada por uma plataforma com varandim e porta que dava para o interior da carruagem. Do varandim havia uma porta de grade que permitia a passagem entre carruagens. A plataforma com varandim tinha ainda duas portas que podiam fechar em andamento dando maior segurança. Os bancos em madeira da carruagem correspondiam às condições de viagem em 3ª classe que existia no tempo de Portugal salazarento. Um vagão de mercadorias com serviço “correio” que consistia num espaço com vários cacifos para separação dos destinos das cartas e um banco onde o empregado dos correios se sentava para cumprir essa tarefa enquanto o comboio circulava. Numa outra (garagem) cocheira segundo a designação da época, estão estacionadas mais duas carruagens, mobiladas e em excelente estado de conservação. Uma delas é a carruagem-salão SEfv 4001 (MD 1) construída em 1905, na empresa «Ateliers Germain», em Monceau sur Sambre, na Bélgica. Foi usada pela primeira vez na linha do Corgo pela Rainha D. Amélia de Orleães, em Junho de 1907, na sua visita às Termas de Pedras Salgadas. E a carruagem-salão SEyf 201 / N.º 1801 (CN 2) construída em 1906, na empresa Carl Weyer & C.ª, em Dusseldorf, na Alemanha, foi tal como a anterior usada pelo Rei D. Carlos na mesma viagem às Pedras Salgadas em 1907.
Ainda no edifício da Estação são conservadas peças, mobiliário, equipamento, utensílios e documentos. Há um exemplar de telefone de comunicação entre estações que era absolutamente necessário porque só podia haver um comboio na linha e o cruzamento só se podia fazer nas estações. Caixas dos bilhetes previamente impressos para os vários destinos e que eram vendidos em estação. Cacifos para despachos de mercadorias, já que cumulativamente ao transporte de passageiros seguiam no comboio carruagens de mercadorias e também correio como já foi referido. Bandeiras de sinalização que podiam ser verdes, amarelas ou vermelhas. Malas usadas pelos revisores. Exemplos de embalagens, caixas e malas de mercadorias despachadas. Há ainda balanças, obliteradoras, continentes para jornais e documentos. Cornetas para avisos sonoros, alicates de revisores fazem parte do acervo. Mapas horários, avisos e tantos outros pormenores que davam vida própria às estações de caminho de ferro de outros tempos que a memória não pode perder.
António Borges Regedor
A propósito da Viagem Medieval em Santa Maria da Feira decidi fazer o trajecto de Espinho -Feira em comboio da Linha do Vouga. A única linha de bitola métrica ainda em actividade em Portugal. A linha não é electrificada, pelo que as composições são automotoras como a da imagem. Para começar houve cumprimento de horários. Tanto o meu, que cheguei antes, como o do comboio. Não há bilheteira física, pelo que a compra do bilhete se faz aos revisores, já na plataforma de embarque. Quando chega o comboio já todos os passageiros estão munidos de bilhetes. A viagem ainda se pode considerar lenta, mas o tempo de viagem entre Espinho e Sta. Maria da Feira é de 30 minutos. É um aspecto a melhorar no processo de reabilitação da linha. Ela tem vindo a ser melhorada de S. João da madeira para Santa Maria da Feira. O inconveniente é as estações que servem Santa Maria da Feira (Cavaco e Feira) estarem deslocadas do núcleo urbano central cerca de mil metros. A estação de Cavaco fica mais próxima do Hospital e a estação de S. Maria da Feira fica mais perto do Castelo e do centro administrativo. Há um enorme potencial de utilização deste modo de transporte colectivo se em Santa Maria da Feira houver uma ligação tipo By-pass da estação do Cavaco-Zona Industrial e Comercial do Cavaco-Hospital-Tribunal-Câmara Municipal-Centro Escolar- Estação Santa Maria Feira e vice-versa. Em análise SWOT uma das fraquezas é precisamente o não ter acesso por transporte colectivo de grandes dimensões. Nomeadamente não estar ligado pela rede de metro da Área Metropolitana do Porto. A reabilitação da linha do Vouga no troço Espinho-Oliveira de Azeméis deve pensar aumentar a frequência e o alargamento do horário. O último comboio a sair de Espinho é às 19h34. Sabendo-se que há muitas actividades a encerrar depois das 20 horas é fácil perceber que o comboio perde potenciais clientes e isso significa mais carros, mais despesa, mais poluição. Exactamente o que se quer evitar desde já, e agora que tomamos consciência da crise que nos condiciona.
António Borges Regedor
Em Vila Real abriram há pouco tempo os percursos naturais do Corgo. São percursos praticamente dentro da cidade, mas num excelente ambiente de ruralidade, beira-rio, entre escarpas e várias cascatas. Vila Real já tinha um caminho pelas margens do rio Corgo que designa por percurso geológico do Corgo. Estes dois percursos estão agora unidos. Há agora uma rede coerente de percursos que ligam a cidade, o rio Corgo e se pode prolongar pela ecopista do Corgo (canal de caminho de ferro desactivado). Começando na Vila Velha (o primeiro núcleo urbano da cidade), pode visitar-se o museu de arqueologia e a partir de vários pontos desse promontório ter vistas excelentes do território. Daí o percurso desce ao rio. Aproveita ao máximo os caminhos de terra batida existentes com passadiços que ajudam a vencer melhor as pendentes e a travessia do rio quando necessário. Daí também se ter a oportunidade de usufruir do espaço das duas margens. O percurso pode ainda derivar por caminhos de ligação a vários pontos da cidade. Liga ao Percurso Geológico do Parque Corgo com ligação ao Parque Florestal, às piscinas, parque de campismo e áreas fluviais com diversos caminhos e relvados muito bem tratados. Este percurso segue até Abambres com uma entrada junto à Ponte da Timpeira. Aqui se quiser pode continuar pela ecopista do Corgo ( o canal de caminho de ferro até Chaves). Para voltar à ”Bila” pode fazê-lo brevemente pela ecopista até à estação de caminho de ferro (hoje desactivada). No final merece provar os “covilhetes” de carne ou as “cristas” e os “pitos” da doçaria conventual que ainda hoje a “Bila” se orgulha de preservar.
Notas:
“Vila Velha” Núcleo primitivo da ocupação deste território até ao século XIII. Com a doação do Foral por D. Dinis em 1289, a vila desenvolve-se para Norte, expandindo-se para lá do promontório inicial. Para que é hoje Vila Real sempre em crescimento.
“Bila” a designação por que os locais tratam carinhosamente e com orgulho a sua cidade.
“Covilhetes” é um produto tradicional local. É um pastel de forma redonda, com recheio de carne de vaca.
“Cristas” e “Pitos” são alguns dos produtos da doçaria tradicional de Vila Real que terá origem conventual (Convento de Santa Clara, também conhecido por Convento de Nossa Senhora do Amparo).
António Borges Regedor
Lembro-me de ser muito pequeno e andar de comboio. Foi numa viagem na linha do Douro e numa das suas derivações. É uma imagem que mantenho na memória mas que não identifico como sendo da linha do Corgo ou do Sabor. A imagem é de um comboio com locomotiva a vapor. As carruagens eram de madeira com varandins abertos e balaustrada de ferro. Na época havia ainda a carruagens de terceira classe. Os preços não se limitavam a primeira e segunda classe. a estratificação social tinha três níveis. A passagem entre carruagens podia fazer-se por uma porta do varandim de uma carruagem, para o varandim da outra. Uma imagem que não se me apaga da memória pelo impacto visual que me fez a linha a correr por baixo da carruagem. A grande velocidade que a idade de deu a perceber. A proximidade dos taludes. A sensação de perigo, de aventura, de me sentir destemido. O barulho dos carris e do ritmado som da passagem das folgas de dilatação. Esse descontinuo da linha que lhe dá continuidade segura. O cheiro a carvão queimado e as faúlhas voadoras algumas ainda incandescentes. A paisagem fugidia e a sensação do meu equilíbrio no comboio voador. Há dias revivi essa parte da minha infância no comboio histórico da linha do Vouga. O meu contentamento.
António Borges Regedor
Em 1968 o país estava servido com 3592 Km de linhas de caminho de ferro para transporte de passageiros e mercadorias.
Nos anos oitenta o sistema ferroviário criou-se uma enorme frente de ataque contra o sistema ferroviário. O sistema ferroviário não era perfeito. Não estava completo. Não chegava a todas as capitais de Distrito. Mas tinha uma enorme cobertura do país. Havia capacidade instalada para produzir material circulante e conhecimento em matéria de manutenção. Precisava de investimento em melhoria da rede, electrificação, segurança, comodidade e rapidez. Precisava de mais e melhor material circulante. Precisava até de chegar mais longe.
Mas outros interesses se organizavam e se sobrepunham ao enorme potencial do serviço de caminho de ferro. O lóbi do betão, mais o das obras públicas, o do automóvel mais o do petróleo coordenados pelo enorme poder do capital financeiro tudo compraram. E os políticos foram os mais baratos nessa compra.
O investimento na rodovia foi feito com a destruição criminosa da ferrovia. Os argumentos da falta de rentabilidade, da falta de passageiros que na altura foram usados contra a ferrovia, foram anos mais tarde os mesmos argumentos que justificariam a manutenção, modernização, comodidade e rapidez da ferrovia. Apenas alguns exemplos: O encerramento da linha do Corgo com o argumento da falta de passageiros foi claramente contrariado anos depois quando a Universidade facultou a Vila Real um enorme crescimento demográfico e enorme crescimento pendular de estudantes e outros profissionais. Pode dizer-se o mesmo com a Universidade de Aveiro e os movimentos pendulares até Viseu que justificariam a linha do Vale do Vouga com a modernização e reconversão que fosse entendida como necessária. Passageiros e mercadorias não faltariam. Para dar um exemplo pela positiva, a Universidade na Covilhã, em Braga, em Guimarães pelo fluxo de passageiros bem que justificaram até a existência, e bem, de intercidades. Melhores linhas e melhores comboios trazem mais passageiros, mais rentabilidade, melhor serviço.
Mas o que aconteceu nas últimas três décadas foi o crime do lóbi da rodovia matar o comboio.
A Resolução de 19 de Fevereiro de 1988 de Cavaco Silva foi a sentença de morte do caminho de ferro. Dizia a resolução: “a modernização dos caminhos de ferro em Portugal não deve fazer-se no pressuposto de que os serviços produzidos e a configuração actual da rede serão uma constante para o futuro”. Dizia-se claramente que a configuração não seria a mesma no futuro. Na cabeça de Cavaco estava a destruição da ferrovia e da sua rede. E foi isso que aconteceu até com os subsídios do estado para a compra de camiões TIR para privados.
Só nestes anos mais recentes se está a salvar o pouco que não foi destruído, e a recuperar o atraso, com um custo elevadíssimo por falta de investimento durante as três décadas passadas.
António Borges Regedor
A partir dos anos 80 há duas décadas a reduzir linhas de caminho de ferro. De 3592 Km de ferrovia existente em 1968 ficaram muitos hiatos na lógica de rede existente até então. Os comboios, os equipamentos, os carris foram retirados, mas os canais permaneceram. Felizmente nesses canais abandonados para a ferrovia foi encontrada uma alternativa à sua utilização e que impede tanto quanto possível a sua maior degradação. Há ainda troços abandonados e maltratados, mas em contrapartida há canais que foram alvo de uma atenção cuidada e hoje são excelentes canais de lazer, de promoção de saúda através da actividade física ao ar livre e igualmente promotores das economias locais pelo público consumidor que levam aos locais servidos pelas ecopistas.
Hoje os canais das linhas desactivadas nas décadas de 80 e primeira década deste século foram felizmente transformadas em ecopistas. Em alguns troços estão bem tratadas, com bom piso, silalização, limpeza. Dou o exemplo dos troços da linha do Corgo nas partes que dependem da Câmara de Vila Pouca de Aguiar, ou do troço da Póvoa a Famalicão no que respeita a estas duas autarquias que cuidaram bem da ecopista.
O lamentável encerramento de linhas que hoje modernizadas teriam a sua rentabilidade no transporte de passageiros, de carga e também muito de turismo. Sendo que o vector do turismo é fortemente beneficiado pelas magnificas paisagens e locais onde esses canais correm. Não será preciso muito para ter noção do enorme potencial turístico e lazer em canais como o do Douro, Corgo, Tua, Tâmega, Vouga, Minho, Póvoa. No caso do Vouga até permite fazer a triangulação Aveiro- Sernada-Espinho e no da Póvoa permite fazer Porto-Famalicão em comboio, daí até à Povoa em ecopista e finalizar com o Metro de regresso ao Porto.
Perderam-se ligações importante por caminho de ferro, mas ao contrário do que é costume a CP e autarquias souberam aproveitar estes espaços para ecovias minimizando assim o impacto dos encerramentos de linhas de caminho de ferro.
António Borges Regedor
Aguardava o último comboio do dia e o que faria ligação na estação central. Linha única ao longo do percurso. Só dupla nas estações para cruzamento dos comboios. Ainda o sol ia quente e o melhor que se podia encontrar era a sombra de pequenas árvores, e elas também com sede. O tempo ia passando para além da hora de tabela do comboio, e o tempo aumentava o estranho da situação. Demasiado tempo era já motivo para descartar o atraso e colocar outra hipótese. Perguntando o motivo do significativo atraso, a resposta foi a de que a locomotiva teria avariado mas que a composição já teria saído com atraso que eventualmente poderia ser recuperado em parte. Foi recobrada a paciência para continuar a espera, até que surgiu ao longe o comboio ansiosamente desejado. Era uma composição com duas locomotivas. A que efectivamente locomovia, e a outra que por avaria e sem capacidade própria se deixava arrastar. Não que não quisesse, mas por não poder. Para além destas, vinham as duas carruagens de passageiros. Uma bizarra composição de duas locomotivas para duas carruagens. Já dentro do comboio e com grande atraso, sem outras composições para cruzar, sem mais ninguém que aquele único comboio naquela única linha, foi então ver do que era capaz aquela locomotiva. O arrancar era penoso, o ganhar velocidade era lento, mas quando lançada na sua força máxima era vê-la cortar o vento que entrava quente pelas janelas abertas, o som ritmado, rápido, do deslizar nos carris, o chiar da fricção das rodas nos carris ao fazer as curvas, sem abrandar, a querer voar galgando distância, a comer tempo engolindo o ar e a sentir realmente o que é um cavalo de ferro.
António Borges Regedor
Linha do Vouga. * Também conhecida pelo Vouguinha. O cais está cheio e ainda há pessoas que se abrigam do sol na pouca sombra do edifício arruinado daquilo que em tempos foi a estação.
Na ausência de bilheteira, o revisor, ainda antes do comboio chegar inicia no cais a venda dos bilhetes.
Em dias de previsão de grande afluência de passageiros, como é o período estival, o comboio é composto por dupla composição. Só não transporta passageiros na última carruagem por não haver plataforma suficiente nos apeadeiros. O comboio vai cheio e estamos a meio do dia.
No Concelho de Espinho tem paragem em Silvalde e no Monte de Paramos. E segue para Oleiros, Paços de Brandão, Rio Meão, S. João de Ver, Vila da Feira, S. João da Madeira, Oliveira de Azeméis. Este percurso dentro da Área Metropolitana do Porto tem enorme potencial. Uma região que também é mal servida de transporte rodoviário de passageiros, e que obriga ao uso intensivo de automóvel. Existe o canal, há necessidade de reduzir as emissões de dióxido de carbono e promover o transporte público. Também a linha teria de ser electrificada e reforçados os meios de segurança nas passagens de nível. O mais importante para garantir o melhor impacto e desempenho seria alterar algum ponto do canal. Seria fundamental passar pelo centro e por vários equipamentos como o hospital, tribunal e outros serviços públicos em Santa Maria da Feira. E o melhor para formular estas condições fundamentais para a sua viabilidade económica, seria o formato de metro de superfície. O percurso que hoje é feito em uma hora, no formato metro e com boa infraestrutura, poderia reduzir esse tempo de deslocação.
Só a requalificação da via não garante o melhor desempenho, que é o da proximidade com as novas zonas urbanas. As Terras de Santa Maria precisam deste transporte público, colectivo e ambientalmente preferível .
*(Experiência de uma agradável viagem neste comboio)
António Borges Regedor
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